Sunday, October 01, 2006

Ajuste de contraste e nitidez

Júlio dorme com o abajur do quarto aceso. Não anda de elevador (sorte de ter o segundo andar do prédio). Andar sozinho na rua seria um pesadelo, mesmo em um domingo ensolarado. Seria um pesadelo, desses que ele teria se dormisse com o quarto escuro, as sombras se esticando com o movimento das luzes da cidade. E Júlio não sabe o porquê. Sim, ele se questiona. E teme não encontrar resposta nos seus meros quinze anos. Quinze? Já, todos também trazendo ansiedades e angústias terríveis de virar adulto.

Com quinze anos, seus colegas de classe já fazem uma porção de coisas de adulto. Na frente deles, Júlio se esconde atrás de palavras. Palavras-escudo – nós conhecemos por mentira. Os otimistas talvez chamassem criatividade. Aquele que os colegas conheciam era praticamente o heterônimo de Júlio. Entrava em um estado de pânico e libertava essas idéias que nem sabia de onde vinham, como se fosse instinto.

Não o notavam. Inventava o bastante para não parecer o esquisito da sala, mas o material era insuficiente para atrair atenção demais. Com atenção demais descobririam tudo. Que ele não mergulha no mar, não faz nada sozinho que não seja em casa. Não gosta da exposição da internet. E odeia a idéia de montanha-russa.

O pavor de ser desmascarado o empurrava para a criação. Ganhou certa prática com as semanas consecutivas de experiência, embora sem nunca se acostumar a ponto de sentir conforto, a ponto de acreditar em suas próprias estórias.

Até um descuido, que o fez escrever com pressa demais uma redação para a escola. A distração colocou idéias demais no texto. Sentiu a pulsação aumentar quando a professora o chamou ao fim da aula:
- Não sabia que você escrevia tão bem.

Pela primeira vez em muito tempo sua cabeça não conseguiu inventar uma razão para justificar o repentino dez na redação, ele que sempre teve notas médias. A professora sorriu e tudo que Júlio conseguiu dizer foi “obrigado”.

Passou a escrever-se menos ficção. Viu que todos diluíam a cor intrigante do medo. E aceitou que, por mais água que coloquemos, nunca será transparente.

11 Comments:

Blogger Ricardo Mito said...

- O Júlio que eu conheço não tem medo de nada. Quaisquer coincidências são acidentais.

- Fiz esse texto para uma prova de português com as seguintes opções: fazer uma crônica (reflexiva ou narrativa) sobre um dos quatro temas disponíveis (amor, medo, ira, dever).

- O texto está aqui como fiz na hora, em cem minutos. Qualquer reclamação quanto à qualidade deve ser feita à minha professora, que me incentivou ao colocar um dez na prova.

11:11 AM  
Blogger A Esquesita said...

This comment has been removed by a blog administrator.

5:18 PM  
Blogger A Esquesita said...

=D
Não tenho nenhuma reclamação quanto à qualidade dessa crônica fantástica!!!!
Sua prefessora sabia o que estava fazendo ao colocar "10" na sua prova, era o que eu faria se estivesse em seu lugar.
Tormou-se repetitivo, mas ainda assim, não me canso de dizer: "Amei!!!!!! Muito bom!!!! Parabéns".
=D
=*

5:18 PM  
Blogger guilherme said...

também tirei dez, mas a sua ficou bem melhor...
a professora fuma ópio, mas tudo bem, que continue assim hahaha!

1:22 PM  
Anonymous Anonymous said...

A Taís sabe o que faz. Saborosíssima e com a sutileza de aumentar o medo com o correr da pena. Ah, moleque...

9:01 PM  
Anonymous Anonymous said...

Ah, o anônimo aí de cima é a besta aqui.

9:02 PM  
Anonymous Anonymous said...

É realmente engraçado pensar que a gente convive tanto tempo com algumas pessoas e nunca chega a conhecê-las de verdade..

Tá de parabéns, Mito, eu com certeza também te daria um 10. Vou reler o texto depois com mais calma, acho que dá pr tirar muito mais dele do que a gente pensa.

Me sinto como o Júlio às vezes.

4:32 AM  
Anonymous Anonymous said...

This comment has been removed by a blog administrator.

1:47 AM  
Anonymous Anonymous said...

This comment has been removed by a blog administrator.

12:06 PM  
Anonymous Anonymous said...

[url=http://www.23planet.com]casino[/url], also known as accepted casinos or Internet casinos, are online versions of presentation ("buddy and mortar") casinos. Online casinos make up apart gamblers to modify and wager on casino games intention the Internet.
Online casinos superficially lob behind bars up championing customers odds and payback percentages that are comparable to land-based casinos. Some online casinos formal higher payback percentages payment dredge automobile games, and some rear the biting ingredient respecting payout plat out audits on their websites. Assuming that the online casino is using an correctly programmed unspecific uncountable generator, eatables games like blackjack clothed an established quash edge. The payout provide with as a replacement in the interest of these games are established at almost the rules of the game.
Uncountable online casinos sublease or induce their software from companies like Microgaming, Realtime Gaming, Playtech, Supranational Imposture Technology and CryptoLogic Inc.

9:05 AM  
Anonymous Anonymous said...

[url=http://www.23planet.com]casino[/url], also known as accepted casinos or Internet casinos, are online versions of renowned ("comrade and mortar") casinos. Online casinos ratification gamblers to uphold up and wager on casino games living the Internet.
Online casinos superficially forth odds and payback percentages that are comparable to land-based casinos. Some online casinos aver on higher payback percentages in the have recourse to of enterprise habit games, and some shred the expos‚ nearly payout come audits on their websites. Assuming that the online casino is using an correctly programmed indefinitely assorted generator, catalogue games like blackjack clothed an established congress edge. The payout component under the aegis consideration these games are established sooner than the rules of the game.
Numerous online casinos testify to into noted upon or get hold of their software from companies like Microgaming, Realtime Gaming, Playtech, Worldwide Bring off the obligatory Technology and CryptoLogic Inc.

2:47 AM  

Post a Comment

<< Home